janeiro 03, 2014

Como será o storytelling no final do século XXI?

No World Science Festival pergunta-se a um conjunto de académicos e escritores, "como será o storytelling no final do século XXI?" e assistimos a mais um momento de alguma perplexidade. Tenho participado em algumas discussões e reuniões deste tipo, por exemplo especular sobre tecnologias e áreas de investigação para daqui a 30 ou 50 anos, e o que se verifica é que temos muita dificuldade em sair do contexto que nos rodeia. Funcionamos numa base sempre incremental, e quando algum de nós "sai demasiado da caixa", ficam todos a olhar para nós com ar de incredulidade e por vezes até de alguma reprovação. É fácil obter aprovação quando se percebe o que outro está a dizer, e de onde parte o seu discurso, quando ele corta demasiado com o estado das coisas, quem nos ouve não consegue lidar com o assunto, e por isso a primeira fase é de refutação. Ou seja, é extremamente difícil perspectivar o futuro, e por isso o caminho proposto por este grupo de pensadores, "Podem os Videojogos ser o Futuro do Storytelling" não é o futuro, mas o presente, como ainda na semana passada tive oportunidade de escrever na Eurogamer, "A forma de expressão mais relevante do século XXI".

Could Video Games Be the Future of Storytelling? (2013)

No grupo temos Jonathan Gottschall, mais conhecido pelo livro “The Storytelling Animal: How Stories Make Us Human” (2012), temos Paul Bloom conhecido por todo o seu trabalho à volta da ciência do prazer, "How Pleasure Works: The New Science of Why We Like What We Like" (2011), temos Keith Oatley conhecido por toda a sua investigação em redor da emoção nas histórias, "The Passionate Muse: Exploring Emotion in Stories" (2012) e ainda os escritores Jeffrey Eugenides, vencedor do Pulitzer Prize, e Joyce Carol Oates vencedora de inúmeros prémios literários. Ou seja, um belíssimo grupo de pensadores sobre os assuntos da narrativa, storytelling, seus efeitos e impactos.

Na pequena discussão Gottschall lança o mote dos videojogos, e os restantes seguem atrás. Nesse sentido acabam sendo discutidos dois modos, supostamente novos, de aceder às histórias, a participação e a colaboração. Em ambas coloca-se em causa a questão da autoria da história, seja pelo lado da participação no desvelar da narrativa, seja pelo lado da criação em modo colaborativo muito em voga nos tempos da Web 2.0. Ambos os modos nunca deixaram de estar entre nós. A participação existe desde que contávamos histórias junto à fogueira, e íamos comentando o que se dizia, nos ríamos, chorávamos, e em tempo real o contador adaptava-se ao modo como o público reagia. Quanto ao colaborativo, e como é referido por Joyce Carol Oates, "originalmente as histórias não tinham um autor", eram de todos, e todos podiam acrescentar, cortar, e fazer evoluir as histórias. Os grandes mitos, lendas ou contos de fadas que hoje temos são fruto dessa teia humana de grande co-criação, da colaboração selecionada pelos processos naturais da evolução das civilizações.

Ou seja, é natural que a natureza da narrativa sofra transformações, mas no final o que conta é aquilo que cada criador pretende expressar. Todos os media criados serviram sempre para comunicar ideias, a forma como o fizeram tem sido quase sempre submetendo-se ao espartilho da narrativa. Mas esse espartilho foi sempre sendo posto a prova. Podemos dizer que existem muitos lugares comuns, muitos padrões que se repetem neste enquadramento que nos ajuda a organizar a informação, mas aquilo que cada autor faz é sempre uma tentativa de se expressar de uma forma pessoal.

Para tornar essa expressão mais pessoal, mais original e única, pode fazê-lo contando algo totalmente novo, que nunca ninguém tenha ouvido. Ou se o que tem a dizer não é propriamente original, pode criar uma forma de organizar aquilo que quer contar de uma forma totalmente nova - deslinearizando, fragmentando, intertextualizando, etc. Por fim, se aquilo que tem para dizer e a forma como o vai dizer não são novas, pode ainda socorrer-se dos elementos plásticos, ou seja do tipo de media e das suas convenções - literatura, cinema, videojogos, transmedia, etc. - para gerar a diferença.

O que será da narrativa daqui a 100 anos? Não faço a mais pequena ideia. Mas tenho ideia que as diferenças não serão tão grandes como pensamos como diz, um dos meus académicos preferidos da atualidade, o Paul Bloom. Elas existirão, e a forma de contar histórias continuará a mudar, mas ao ritmo da nossa capacidade de as experienciar, e não ao ritmo das tecnologias. Apesar de todo o interesse sobre o tema que as tecnologias têm feito despertar nos últimos anos - veja-se os cursos online, assim como as iniciativas online para descobrir o novo storytelling, ou ainda as tentativas do jornalismo de se reinventar.

Human history is rich with stories, and as our culture and technology changes, so do the ways we tell stories. For example, from its roots in oral tradition, storytelling branched off into literature, artwork, and film. Where are narratives headed next? Depending on your hobbies, the answer may or may not surprise you. Literary scholar and author Jonathan Gottschall believes that video games will be (and arguably already are) the next step in storytelling in this digital age. He cites video games' ability to allow people to play an active role in narratives to be their greatest strength.

[Vídeo enviado por David Mota]

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